11 March 2007

Poder-se-à apaixonar-se por associação? (Parte II)

Fico a olhar para ela, e deixo-me envolver. Fixo o olhar naqueles olhos e fantasio compenetrada, já que ela tem tanta reminiscência tua nos seus olhos como na sua personalidade. Ela acredita que estou atenta à aula, porque de vez em quando aceno com a cabeça para tornar o facto de estar a olha-la enamoradamente como se de ti se tratasse menos constrangedor. E tal como tu ela acha-me uma idiota. Porque por cada vez que ela me dirige o olhar, eu, intimidada, desvio o meu. E a cada vez que me faz uma questão, engasgo-me nas minhas próprias ideias. Tal como quando te vejo, sei que tenho tanto para dizer mas não sou capaz de articular uma única frase. Tudo o que disser vai parecer-te óbvio e básico porque és tão mais sábio; tudo o que eu lhe disser a ela sobre o assunto será igualmente trivial porque ela o domina.


Como é que é possível eu transportar o que sinto por ti para uma professora? A tua ausência física é assim tão abismal que tenho de refugiar-me nos olhos de outra pessoa? É que por vezes tenho mesmo a sensação que a amo. E que a admiro. Mas até que ponto a conheço? Até que ponto te conheço a ti? A contaminação de identidades não pode tornar-se assim tão vinculativa. Como é que tu alteras a minha percepção das várias identidades? Isso é coisa que uma criança aprende aos três anos segundo a psicologia moderna. Vou passar a ver-te em todo o lado? Não me digas!
Com ela, tenho a mesma relação amor-ódio, que não é recíproca nem sequer assumida. Mais uma vez finjo indiferença. Porque essa sim, é recíproca, estou certa. Que raio de actriz me saí, não? O amor e o ódio, os dois sentimentos por excelência, e eu a molestá-los descaradamente. A reprimi-los e a sufocá-los, a encenar outros tão discretos como a apatia. A ela amo-a, e admiro-a pela sua inteligência, classe, honestidade, cultura. Assim como a ti. Mas odeio-a por fazer-me sentir como se estivesse perante um Dalai Lama ou um Nelson Mandela. E é exactamente assim que vocês me fazem sentir. Como se fosse uma criancinha sem prendas na noite de Natal, a chorar silenciosamente porque está sozinha. Lágrimas secas, numa posição fetal.
Olho-a enamorada, com os meus olhos de cor quente carregados de desejo. Olho-a e deixo-me apaixonar por aquela tonalidade de azul; nem o seu inestético pontiagudo nariz se intromete nas minhas fantasias, porque é um nariz tão inestético quanto o teu, que eu tanto gosto.


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