04 March 2007

I Capítulo

Uma vez um sábio disse-me: “Só conseguirás distinguir o verdadeiro amor de uma paixão quando conseguires dar uma queca sem pensares nessa pessoa no dia seguinte. Antes disso, todas as paixões que vierem vais confundi-las com amor”. E assim o fiz, mas primeiro dei uma queca com o Sábio.


Tinha 18 anos, e ainda só tinha feito sexo com um homem: o meu primeiro namorado. Dos 15 aos 18 fui monogâmica. Desde então nunca mais. O Primeiro também perdeu a virgindade comigo. Foi desastroso, ambos virgens, mas lindo. Porque na altura amava-o e sentia-me amada. Até que descobri que talvez não fosse amor, porque dizem o amor ser eterno, não é? Então, pelos visto não tinha sido daquela vez que me saiu o jackpot amuculado de três semanas ou mais. Porque acabei por fartar-me, e apaixonei-me todos os dias por um homem diferente: um colega de turma, um melhor amigo, um amigo, um amigo de um amigo, um simples conhecido, um desconhecido numa discoteca, etc. Mas nunca as minhas traições tinham sido materializadas. Eram traições puramente virtuais, os cenários idílicos e o romance passava-se todo na minha cabeça, nas poucas vezes em que o sexo com o Primeiro era bom. Até um dia. O difícil foi trair a primeira vez. Traí uma, duas, três, quatro vezes. Depois disso perdi-lhes a conta. Fui perdoada uma, duas, três, quatro vezes. Depois disso tornei-me mestra na arte de trair e nunca mais fui apanhada. Cheguei ao ponto de só conseguir fazer sexo com o meu namorado quando fantasiava com outros homens, cheguei a sussurrar-lhe ao ouvido outros nomes que ele nunca ouviu porque eu abafava-os entre gemidos.


Apaixonei-me por todos eles e muitos mais, mas traí só com aqueles que não se importavam de ser o Outro. Apaixonei-me por todos eles e, na vaga esperança de serem o verdadeiro amor, e concomitantemente no medo que perder aquele que também acreditava ser amor, fui tentando com todos. Foi terapêutico. Tinha sido tudo o que o sábio me disse, se fosse uma questão só carnal, não pensaria neles durante muito tempo.


Por mais irónico que possa parecer, continuava a amar o Primeiro. Não podia viver sem ele, mas também não podia viver sem a emoção da traição, a adrenalina da mentira. A cada nova traição, não podia deixar de sentir o florescer de um novo sentimento que ainda não sabia bem o que seria, mas que valia o risco apenas para descobrir. A descoberta de novas sensações, novos cheiros, prazeres desconhecidos. Cada um deles tinha algo a ensinar-me. A atenção era tudo. Era a atenção que não sentia desde os primeiros tempos com o Primeiro, e as sensações que acreditava adormecidas ou que acreditava serem possíveis apenas uma vez, na primeira vez, revivia-as a cada traição. Nunca traí por sexo. Afinal, não era mais do que vítima de uma demanda incansável pelo Tal. Tinha começado essa demanda uns dias após o meu 19º aniversário, e não tencionava desistir até ter a certeza que o tinha encontrado.

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